sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

A década perdida

Esta expressão não é a de um economista para se referir à década de 90 no Japão. Nem de um jornalista. Quem disse isto foi Bradley Wiggins. Os últimos 10 anos de ciclismo são para apagar do mapa.

E hoje e amanhã Armstrong vincou mais a ideia relativamente ao ciclismo. Sempre fui um fã incondicional do texano e nunca acreditei que ele fizesse parte daqueles que se dopavam, mas sempre disse que no dia em que tal se provasse eu admitiria. Não foi o caso mas o próprio admitiu por isso... Apesar de toda a sua humildade perdi uma grande admiração que tinha por ele.

De facto toda a sua história, de vida e desportiva, parecia demasiado perfeita. Contra ele há vários anos consecutivos de vitórias à custa de dopagem e uma confissão demasiado tardia.

A seu favor apenas ficou a sua humildade: admitiu tudo quando já não precisava de o fazer, nunca disse que os colegas de equipa se dopavam, nem acerca do resto do pelotão, algo que não se pode dizer em sentido inverso. E nunca se desculpou dizendo que todos o faziam, apenas disse que o fez porque queria ganhar a todo o custo.

De resto não há muito mais a acrescentar sobre o atleta, mas sobre o desporto sim...

Tal como os erros de arbitragem não afastam os fãs do futebol, os escândalos de doping não vão afastar os fãs. Sempre fui um grande fã dos desportos de resistência, onde o espírito de sacrífico é levado ao extremo e não são os escândalos que me vão fazer mudar de ideias e não ver o Tour em 2013.

O ciclismo profissional mais avançado (protour) é um trabalho para os profissionais da área e envolve orçamentos que faziam corar muitas equipas de futebol. E é por isso que ganhar é tão importante. Mas se em qualquer empresa há penalizações muito graves para burlas, no desporto profissional também deveria haver e, pelo que se tem visto, os actuais afastamentos de ciclistas e multas não têm sido suficientemente dissuasores. Esperar que a agência internacional antidopagem consiga algum dia estar um passo à frente dos dopados é uma ilusão.... Julgo que é necessário ter mão bem mais pesada, em termos de afastamentos de ciclistas e multas pecuniárias.

Em cima disse que os últimos 10 anos de ciclismo são para apagar. Mas o mais correto a fazer talvez seja apagar os últimos 10 grandes ciclistas da memória, não o desporto em si, as bicicletas não fizeram nada de mal.

Hoje perguntaram-me "então agora qual é o teu ciclista favorito?" Eu dei outro nome, já não é o Lance Armstrong. Mas penso que da próxima vez que me perguntarem, vou responder não o nome de uma pessoa mas de uma etapa que eu goste.

PS: retirar a modalidade dos JO, símbolo do desportivismo, também talvez ajudasse a criar impacto.

2 comentários:

João disse...

Nunca fui grande fã de ciclismo, nem como praticante nem como simples apreciador. Quando era novo gostava de ver o Indurain, mas ultimamente só por vezes via uns minutos do Tour mais nada.
Acho que o que se deve fazer com urgência é concluir se só alguns usam doping ou se é a maioria. Pelo que li sobre a entrevista do Lance ele deixa entender que a maioria são dopados e que só meia dúzia são uns heróis (eu digo, que estes provavelmente nunca ganharam nada). Se isto for verdade, concordo contigo e é urgente tirar o ciclismo dos jogos, até porque há muitas novas modalidades que querem entrar e que não o podem fazer devido ao excesso de atletas nos JO.
Para além disso, nesse caso, acho que mais vale assumir que ciclismo é um desporto de dopados para não haver ilusões quanto à verdadeira resistência e desportivismo desses atletas. A verdade é que se a maioria se dopa, o que ganha não deve ser só aquele que se dopou melhor pois não? Se calhar é o melhor atleta do grupo dos dopados...

Nuno disse...

Eu também não sou grande apreciador da modalidade apesar de em miúdo ter assistido a bastantes etapas do Tour e da Volta a Portugal. No entanto, não me passa despercebida a capacidade de sofrimento, resistência e abnegação dos ciclistas. Quando há um fugitivo, solitário com a sua bicicleta e o asfalto durante dezenas de quilómetros, há algo de heróico nesse feito que inspira e não se pode negar.

O Lance preferiu claramente a via mais fácil durante muitos anos. Não sei se tudo começou pela pressão dos colegas, treinadores ou do próprio, e nem me interessa. O que fica para a posteridade, quando o peso da realidade e das mentiras finalmente o apanharam, é que nunca se saberá o real valor do atleta. Se ganhou porque era o melhor no meio de dopados, se era o que tinha o melhor doping, se era um dos poucos dopados, nunca se saberá. E é isso que fica, um homem que se fez um herói e depois destruiu tudo. Podia ter ficado para a lenda - fosse com que vitórias fosse -, podia ter acarinhado até ao fim da sua vida os sofrimentos e as alegrias daquele desporto. Com vitórias ou derrotas ninguém lhe retiraria os quilómetros cruéis em cima da bicicleta. No fim foi só mais um batoteiro.

Caiu sobre a espada, quem sabe cansado da pressão e de fugir. Mas agora virão por aqueles que o ajudaram a mentir durante anos e começará tudo de novo.

Ao ciclismo, concretizado o final há muito anunciado, resta fazer a purga mais profunda possível e esperar que os fãs lhe estejam dispostos a dar uma última oportunidade.